02/05/10

a figura

Não são ainda conhecidas em detalhe as medidas de austeridade aprovadas entre o governo grego e os representantes da UE e do FMI como condição para o empréstimo de 100 biliões de euros a conceder ao país. Aquilo que já se pressente é que será uma grande humilhação para a Grécia ter o seu país a ser governado por alemães e americanos.
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Nos seus grandes princípios, as medidas incluem o aumento da idade da reforma de 53 para 67 anos (que é a idade da reforma na Alemanha); a abolição do 13º e 14º meses de salário na função pública (na Alemanha não existe tal coisa); o congelamento dos salários por três anos na função pública; o aumento do IVA em 2 a 4 pontos percentuais; o aumento dos impostos nos combustíveis, tabaco e alcoól; e um grande "crackdown" a todos aqueles suspeitos de evasão fical, que são muitos na Grécia.
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Sondagens recentes indicam que 67% da população é contra as medidas de austeridade e mais de 50% dos gregos declaram-se dispostos a vir para a rua protestar contra as medidas. Como se pôde chegar a esta situação, que é semelhante à portuguesa, só diferindo um pouco no grau de gravidade? Antes de mais é bom lembrar que todos os PIGS possuem democracias recentes, a Grécia e Portugal a partir de 1974, a Espanha a partir de 1975, a Itália a partir da Segunda Guerra, mas com toda a instabilidade conhecida que lhe dá, em média, um governo por ano ao longo dos últimos 50 anos.
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Aquilo que falhou foi a democracia. Os países de tradição católica (ortodoxa Grécia incluída) não possuem tradição democrática e mais uma vez demonstraram não a possuir: desgovernam-se me democracia, como já várias vezes aconteceu no passado. O seu regime natural de governação possui, no topo da hierarquia, um homem - que designarei como chefe de Estado - dotado de poderes supremos e absolutos, e que não responde perante a população.
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Esse homem é a cara exterior do país e a imagem da sua credibilidade. É ele que dá a cara pelo país e que decide depois internamente aquilo que tem de ser feito, isto é, é ele que governa. A governação é inteiramente da sua responsabilidade e uma má governação é-lhe imputada directamente a ele. Numa palavra, é a figura do Papa da Igreja Católica.
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Quando os países de tradição católica são governados de acordo com este modelo, eles são capazes de criar economias extraordinariamente prósperas, e não há democracias que lhes ganhem, como sucedeu com o Portugal de Salazar e a Espanha de Franco. Entre 1926 e 1974, o país que mais cresceu na Europa Ocidental (entre os 12 países que eram nossos parceiros na UE quando aderimos em 1974) foi Portugal (veja aqui). A Espanha tem um registo semelhante desde que Franco chegou ao poder até o abandonar em 1975. A base de dados que utilizei é absolutamente imparcial (na realidade, é até protestante) e está aqui.
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É em direcção a este modelo de governação que os PIGS vão ter de caminhar se querem recuperar a prosperidade económica e a reputação internacional. As medidas de austeridade agora impostas à Grécia não vão resultar, se é que serão impostas de todo (cf. aqui).

1 comentário:

  1. Como é que o personalismo de que fala se concilia com a imposição das escolhas por parte um líder? Tanto na democracia de que fala como na pessoalização do poder político a la ICAR as escolhas são impostas e, convenhamos, incompatíveis com a noção de que cada pessoa governada é única. Por outras palavras, o modelo que afirma como ideal para os países católicos também não serve, de acordo com os seus próprios pressupostos.

    João Paulo Magalhães

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