Os mercados financeiros não acreditam - ninguém, no seu perfeito juizo, pode acreditar - que o pacote de ajuda à Grécia aprontado este fim-de-semana em Atenas, e pronto para aprovação na UE, resolva o problema grego a longo prazo. Por isso, os mercados desferiram hoje novo ataque aos PIGS, tendo a Espanha como alvo. Portugal foi atrás, e as bolsas ibéricas caíram mais de 5%.
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O abandono do Euro por parte dos PIGS é agora inevitável, embora não seja fácil prever o timing. O meu propósito neste post é descrever brevemente como se faz a saída do euro para uma nova moeda portuguesa, a que chamarei bento, e os seus efeitos imediatos.
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Num dia, geralmente de fim-de-semana, o governo manda congelar todos os depósitos em euros detidos nos bancos nacionais. O congelamento pode durar vários dias. Esses depósitos são então convertidos em bentos a uma certa taxa oficialmente definida, v.g., 1 euro = 1 bento, significando que os depositantes serão a partir de agora ressarcidos dos seus depósitos em bentos e não em euros. Na reabertura do feriado bancário deixa-se o mercado cambial funcionar e o bento desvaloriza, por exemplo, para 1 euro = 1.25 bentos.
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É nesta desvalorização do bento, que eu supus ser de 25% (e que deverá andar muita próxima do que será a realidade) que está a chave da recuperação da economia. Todos os produtos importados do estrangeiro passam a custar 25% mais caro, e os portugueses passarão a importar menos; ao mesmo tempo, os produtos portugueses no estrangeiro passam a ficar 25% mais baratos, e os portugueses passam a exportar mais. É este aumento da produção nacional para o mercado interno, substituindo as importações, e para o mercado externo, aumentando as exportações, que fará subir o emprego no país. Não há outra solução. (É também o facto de, sem saír do euro, o país não poder desvalorizar que torna as soluções alternativas ineficazes, como aquela que está a ser elaborada para a Grécia).
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Inicialmente, a inflação vai aumentar porque os produtos importados são agora mais caros, mas este fenómeno só dura até eles serem, em parte, substituídos por produção nacional. Devido ao aumento da inflação as taxas de juro vão também subir, mas este efeito tenderá também a ser temporário.
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É o Estado, através do Banco de Portugal, que fica com os euros confiscados aos cidadãos em troca dos bentos. São esses euros que servem de garantia à emissão dos bentos, mais o ouro e outros activos (v.g., d´lares) detidos pelo Banco de Portugal. Em princípio, o Estado poderá utilizar uma parte desses euros para liquidar uma parte da sua dívida externa, que está denominada em euros.
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As dívidas dos cidadãos (v.g., créditos hipotecários) e das empresas portuguesas aos bancos nacionais são também convertidas à taxa oficial 1 euro = 1 bento, embora as taxas de juro sobre as dívidas em bentos, como referido anteriormente, tendam a subir no futuro imediato face ao nível que teriam em euros. Em dificuldades maiores ficam as empresas privadas que tenham dívidas em euros perante o estrangeiro (são poucas em Portugal), pois as suas receitas passam a ser em bentos e têm de servir a dívida em euros, com o bento desvalorizado à taxa assumida de 1 euro =1.25 bentos (ou 1 bento = 0.80 euros).
Os juros disparariam. Não se iluda.
ResponderEliminarProfessor, confirmando-se este cenário, não faria sentido Espanha e Portugal adoptarem a mesma moeda?
ResponderEliminarCom o aumento da inflacao, havera tendencia para uma subida dos salarios (efeito das expectativas). O ganho em competitividade devido 'a desvalorizacao da moeda seria perdido no aumento dos custos de producao devidos ao aumento dos salario...
ResponderEliminarA nao ser que seja imposta tambem congelacao dos salarios. Mas ai, qual a diferenca entre esta situacao e a situacao actual da Grecia?
No cenario actual os Gregos vao ficar mais competitivos no contexto da UE, devido 'a contencao dos seus salarios (apesar de apenas na funcao publica la' do sitio).
Rui Silva